Análise

64% dos jovens ganham dinheiro, mas muitos não entendem um recibo de pagamento

por EDULOG


7 de agosto de 2017 |

Estudo da OCDE sobre literacia financeira revela que muitos dos jovens têm dificuldades em compreender questões relacionadas com dinheiro.

Cerca de 56% dos adolescentes tem uma conta bancária e o respetivo cartão de débito. Mas quando o PISA 2015 avaliou o que sabiam sobre o mundo das finanças 48 mil estudantes de 15 anos de 25 países e regiões da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), percebeu que dois em cada três estudantes não têm competências para gerir uma conta ou mesmo interpretar um extrato bancário.

Os investigadores do PISA avaliaram a capacidade dos alunos para lidar com situações do quotidiano que envolvem tarefas simples, como gerir as suas finanças pessoais, as contas bancárias, os cartões de débito ou mais complexas, como perceber o cálculo das taxas de juros relativas a um empréstimo.

Os primeiros dados divulgados em maio mostram apenas os resultados do desempenho dos jovens da Austrália, Bélgica (Comunidade Flamenga), Brasil, Canadá (Colúmbia Britânica, Manitoba, Nova Brunswick, Terra Nova e Labrador, Nova Escócia, Ontário e Prince Edward Island), Chile, China (Pequim, Xangai, Jiangsu e Guangdong), Itália, Lituânia, Países Baixos, Peru, Polónia, Federação Russa, República Eslovaca, Espanha e Estados Unidos. O próximo relatório incluirá Portugal.

No artigo “Dólares e bom-senso: a literacia financeira dos jovens de 15 anos”, o secretário-geral da OCDE, Angel Gurría alerta para a importância do tema. Lembra que “a economia digital expõe os consumidores a novas ameaças e riscos de fraude que ganham terreno face à baixa literacia financeira”. E que se o conhecimento financeiro fornece as bases para decisões importantes ao longo da vida, como avaliar um contrato de trabalho, contrair um empréstimo bancário ou gerir uma poupança para a reforma, o cenário encontrado pelos investigadores é motivo de apreensão.

Apenas um em cada dez estudantes consegue entender questões complexas, como a tributação de impostos sobre os rendimentos. E menos de um em cada cinco não atinge um nível básico de proficiência em literacia financeira nesta avaliação realizada pelo PISA, mesmo em países e economias da OCDE com resultados gerais elevados ou médios.

Exemplo disso? Cerca de 64% dos alunos avaliados ganham dinheiro com algum tipo de atividade laboral. Mas muitos não entendem um orçamento simples, nem um extrato bancário ou um recibo de pagamento. Cerca de 59% dos inquiridos admite ainda receber mesadas ou dinheiro para gastar no dia-a-dia.

No discurso de apresentação do relatório, em Paris, Angel Gurría chegou mesmo a considerar as descobertas “chocantes” e “preocupantes: “Os jovens enfrentam escolhas financeiras mais desafiadoras e perspetivas económicas e de emprego mais incertas, no entanto, muitas vezes não possuem a educação para tomar decisões informadas sobre questões que afetam seu bem-estar financeiro”, alertou.

Chineses são os melhores

Entre os países e regiões cujos resultados foram apresentados, a China (regiões de Beijing, Shangai, Jiangsu e Guangdong) obtém a maior pontuação média. O segundo lugar entre os melhores é ocupado pelos estudantes da Comunidade Flamenga da Bélgica. Seguidos pelos estudantes das províncias canadianas participantes (Colúmbia Britânica, Manitoba, New Brunswick, Newfoundland e Labrador, Nova Scotia, Ontário e Prince Edward Island) e dos estudantes da Federação Russa, dos Países Baixos e da Austrália.

Base sólida a matemática e leitura

Os peritos da OCDE acreditam que os bons resultados em literacia financeira estão relacionados com o domínio de competências nas áreas da matemática e da leitura. O que, segundo Angel Gurría, levanta uma outra questão: saber se o que os alunos aprendem na escola “automaticamente os ajuda a adquirir competências financeiras”? Neste ponto, o secretário-geral da OCDE admite a existência de dados contraditórios que terão de ser melhor analisados.

“Por um lado, ter uma base sólida a matemática e leitura é crucial para navegar no cenário financeiro, entender desde percentagens computacionais até a leitura de um extrato bancário. Por outro lado, a avaliação da alfabetização financeira do PISA revela que 38% da variação na alfabetização financeira não é explicada pelas habilidades de matemática e leitura”, constata Gurría.

Em média, em 10 países e economias participantes da OCDE, mais de 1,2 milhões de estudantes de 15 anos (22%) pontuam abaixo do nível básico de proficiência em literacia financeira (nível 2). Dito de outro modo, os alunos cujos conhecimentos estão neste nível podem, “na melhor das hipóteses reconhecer a diferença entre necessidades e desejos, tomar decisões simples sobre gastos diários e reconhecer a finalidade de documentos financeiros diários, como uma fatura”, explica a OCDE.

No extremo, cerca de 12% dos alunos obtêm o nível mais alto de proficiência (nível 5). O que significa que têm competências para tomar decisões financeiras complexas que podem vir a ser relevantes no futuro. Conseguem ainda descrever os resultados potenciais das decisões financeiras que tomam e compreender de forma mais ampla o panorama financeiro, por exemplo, ao nível da cobrança de impostos sobre os rendimentos.

Falar de dinheiro em casa

A OCDE alerta ainda para a importância dos pais no apoio aos filhos para que estes possam desenvolver conhecimentos e comportamentos que contribuam para a sua independência e bem-estar financeiro.

Discutir questões de dinheiro com os pais – ainda que só “às vezes” - traz melhores resultados no desempenho financeiro do que nunca discutir o assunto. A literacia financeira está também associada a um comportamento mais orientado para a poupança. Na prática, os testes mostram que em média, em todos os países da OCDE, os alunos que pontuam no nível 4 ou 5 em literacia financeira estão mais predispostos (têm três vezes mais probabilidade) a poupar dinheiro para realizar uma compra para a qual ainda não têm dinheiro suficiente, do que os alunos que pontuam abaixo do nível 1.

Dito de outro modo, os alunos que pontuam nos níveis 4 ou 5 relatam mais do que os de nível 1 que preferem poupar e adiar a compra até juntar o dinheiro necessário, ao invés de tentar realizar a compra pedindo dinheiro emprestado a amigos ou à família.

Para Angel Gurría, as conclusões do relatório “PISA 2015 sobre Literacia Financeira” não deixam dúvidas sobre qual deverá ser a atuação dos Governos e dos decisores políticos: promover iniciativas que desenvolvam as competências financeiras dos jovens, dentro e fora das escolas, e contribuir para a disseminação das melhores práticas.

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