Estudos
por EDULOG
30 de maio de 2016 |
A problematização em torno do conceito de “competência” em educação e formação de professores, leva Manuela Esteves a clarificar as suas múltiplas formas de definição. Uma vez que todas as definições variam consoante o domínio onde são usadas. O artigo “Construção e desenvolvimento das competências profissionais dos professores”, publicado na revista de ciências da educação “Sísifo” em 2009, mostra como na área da formação de professores “o conceito remete para um certo de número de traços particularizáveis evidenciados na ação”.
Segundo a autora, esses traços podem ser observados, ou seja, a sua presença, ausência e frequência podem ser constatados. Como? “Podem ser observados e descritos sem que necessariamente se lhes tenha que atribuir um valor”, lê-se no artigo. Em exemplos, como “questiona os alunos”, “diversifica os materiais”, “usa recursos tecnológicos”. No entanto, alerta a investigadora: “O somatório destas competências entendidas em sentido analítico tão pouco habilitará, por si só, à emissão de juízos de valor sobre a competência global de um profissional”.
Manuela Esteves recorda as particularidades do movimento de formação baseada nas competências - iniciado nos anos 60 nos EUA, mas reunindo adeptos nos anos 80 no Reino Unido. Numa primeira fase, a corrente surge ligada à formação de professores, só depois se expandindo a outros domínios. Sob a influência da psicologia behaviorista, os seguidores deste movimento, promoveram uma reforma dos currículos escolares centrando-os no que ficou conhecido como a “pedagogia por objetivos”.
Entendendo competência enquanto comportamento diretamente observável, os programas de formação baseada nas competências, “Performance/Competency Based Teacher Education” (P/CBTE). J. Swanchek e J. Campbell sumarizam as características dos P/CBTE nos seguintes traços: a especificação precisa de competências ou comportamentos a serem aprendidos; a modularização da instrução; a avaliação e o feedback; a personalização; a experiência de campo.
Segundo a investigadora, “a seleção das competências a adquirir era feita de entre aqueles comportamentos dos professores que a investigação científica de natureza experimental tivesse mostrado que estavam positivamente correlacionados com aprendizagens dos alunos”.
As críticas a estes programas intensificaram-se a partir da década de 80, essencialmente por dois argumentos, refere a investigadora. Um, sublinhava a “inadequação da definição analítica das competências para retratar o perfil dos profissionais mais bem-sucedidos, perfil esse que não se limitava ao mero somatório de competências isoladas”. O outro, referia-se “à falta de evidências científicas que corroborassem a superioridade dos programas baseados nas competências em relação a outros”.
Ao mesmo tempo, na Europa surgiam estudos em diversas áreas da formação profissional, não apenas de professores, mostrando outras evidências. Nomeadamente, escreve Manuela Esteves, que “os profissionais excelentes apresentavam um conjunto de competências genéricas ou globais bem mais importantes para explicar o seu sucesso do que as competências analíticas muito numerosas a que a análise das funções laborais tinha conduzido”. Esta nova abordagem pelas competências genéricas destacava as qualidades pessoais relevantes e não apenas as características técnico-científicas subjacentes à ação. Em detrimento dos milhares de competências associadas a um desempenho profissional específico, a corrente europeia identificava listas menos numerosas de competências genéricas.
Uma dessas listas, criada por R. Boyatzis, em 1982, incluía, por exemplo, a “preocupação com o impacto”, a “autoconfiança”, o “uso de apresentações orais”, a “gestão de processos grupais”, o “autocontrolo” e a “energia e adaptabilidade”.
Na década de 90, o conceito de competências ganha novos contornos com a definição de Ph. Jonnaert que as entende “como as formas como os sujeitos gerem os seus recursos cognitivos e sociais na ação, numa dada situação”. Em 1996, M. Éraut analisa a relação entre conhecimento e competência e apercebe-se que “só parte daquilo que um profissional competente faz, encontra raízes no programa de formação orientado para o desenvolvimento de competências que lhe possa ter sido proporcionado.” Ou seja, prossegue Manuela Esteves: “Haverá largas áreas do saber-fazer omissas nos programas de formação, e mesmo quando há coincidências, o conhecimento comum a ambos os cenários – o da formação e o da ação profissional – é estruturado, nomeado e percebido de formas diferentes.”
Outros autores, como Jonnaert, G. Le Boterf, defendem a ideia de que as situações e os contextos de trabalho são imprescindíveis para compreender a génese e a natureza das competências. Ou, como refere M. Éraut: “Não se pode caracterizar conhecimento profissional sem ter em conta o modo como este é aprendido e como é usado”.
Em Portugal, E. Mesquita desenvolve em 2005 um estudo sobre as representações dos futuros professores - a concluir a sua formação inicial - acerca do que acreditam ser as competências mais necessárias para a docência. E também o modo mais adequado de as construírem. As respostas dos inquiridos apontaram essencialmente aspetos relacionais com os alunos, as famílias, os colegas e a comunidade em geral.
Também foram consideradas importantes competências ligadas à administração da sua própria formação, ao enfrentar de deveres e problemas éticos, à criação de dispositivos de diferenciação pedagógica e ao envolvimento dos alunos no processo de aprendizagem.
Ainda assim, alguma investigação realizada em Portugal tem apontado “deficiências importantes no desenvolvimento de competências de ordem didática em programas oferecidos por escolas superiores de educação no que respeita às disciplinas de Matemática, Ciências da natureza, Línguas Estrangeiras, Tecnologias da Informação e da Comunicação, Física e Química”, aponta Manuela Esteves. Bem como a “prevalência de uma lógica de transmissão do saber entendido como património estático”.