Estudos

História da formação de professores dos ensinos primário e secundário

por EDULOG


28 de novembro de 2016 |

O “estado da arte” da investigação produzida sobre história da formação de professores em Portugal do período do Estado Novo até à democracia.

A História da Formação de Professores torna clara a importância dos docentes nas transformações educativas ao longo dos tempos. Como objeto de estudo, o interesse por este campo torna-se evidente nos anos 70. “A tese de António Nóvoa (1987) trouxe para o campo um diálogo, que mantém algumas das suas potencialidades, entre a História e a Sociologia, seguido por outros autores”, apontam Joaquim António de Sousa Pintassilgo e Maria João Mogarro.

No artigo “A historiografia portuguesa da educação: balanço e reflexões a partir do exemplo da história da formação de professores”, os dois professores do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa traçam o “estado da arte” da investigação produzida sobre a História da Educação, focando tanto aspetos da formação como da carreira docente. Pintassilgo e Mogarro concluem que a formação dos professores do ensino primário e do secundário têm sido consideradas separadamente. E entre os vários e diversificados contributos de trabalhos e artigos sobre esta matéria, os investigadores apontam os autores que consideram mais relevantes.

História da formação dos professores primários

Joaquim Ferreira Gomes, professor da Universidade de Coimbra, é identificado como uma “figura pioneira” no conhecimento sobre o ensino normal primário, como provam dois dos seus artigos: “Escolas normais para a habilitação de professores primários” de 1979 e “O ensino da pedagogia e psicologia nas escolas normais primárias (1862-1974), publicado em 1998.

Outra referência para o estudo da fase inicial do Estado Novo português no que concerne à vertente educativa é o livro de Maria Filomena Mónica intitulado “Educação e sociedade no Portugal de Salazar (A escola primária salazarista, 1926-1939) (1978)”.

Toda a obra de Rogério Fernandes é considerada “igualmente uma referência incontornável”, uma vez que o autor esteve envolvido nas transformações ocorridas entre 1974 e 1976. “A sua participação na definição das políticas educativas, posteriores à Revolução de 25 de abril, foi precedida de duas obras, em que traçou a situação da educação portuguesa no final do Estado Novo, contemplando a vertente da formação de professores - Ensino: setor em crise (1967) e Situação da Educação em Portugal (1973)”, escrevem Joaquim António de Sousa Pintassilgo e Maria João Mogarro. Deste investigador merece ainda destaque a obra “Educação: uma frente de luta (1977)”, por fazer uma reflexão sobre os desafios colocados à formação de professores na sociedade democrática e por fornecer informações significativas sobre a vida das escolas do magistério primário no período revolucionário.

Mais recentemente, em 2009, António Nóvoa, outra referência para a história da profissão docente, publicou “Professores: imagens do futuro presente”, no formato de E-book. A obra retoma algumas das suas ideias sobre os professores e a sua formação no contexto atual. O autor escreve que os professores ocupam novamente um lugar de grande relevância pública, por isso, reclama a necessidade de a formação ser construída dentro da profissão e diz que a escola é o lugar dessa formação. Para António Nóvoa, os professores precisam de assumir uma nova capacidade de comunicação, explicam Pintassilgo e Mogarro: “Neste contexto, o “bom professor” ganha relevância, definindo-se em função de cinco facetas: conhecimento, cultura profissional, tato pedagógico, trabalho em equipa e compromisso social.” Textos legais e documentos oficiais, regulamentos, estatísticas, relatórios técnicos, documentos de circulação interna e documentos administrativos de arquivo, livros, jornais e revistas têm servido como fontes documentais para o estudo da formação de professores, realçam os autores deste artigo. Em relação à imprensa pedagógica, que também constitui um acervo documental importante para a compreensão do campo educativo, Pintassilgo e Mogarro destacam a revista “Escola Portuguesa (1934-1974), publicada por organismos governamentais que tutelavam o ensino primário.

História da formação dos professores do ensino secundário

A obra “Formação de professores do ensino secundário (1901-1988)” Legislação essencial e comentários”, de Luís António Pardal (1992) é considerada uma coletânea de referência, uma vez que junta às principais leis aplicadas a este setor, comentários do autor e uma análise dos sucessivos sistemas de formação, concretizados ou tentados: Curso de Habilitação para o Magistério Secundário (1901), Escolas Normais Superiores (1911), Projeto Camoesas (1923), Secções de Ciências Pedagógicas das Faculdades de Letras e Liceus Normais (1930) e Ramo de Formação Educacional das Faculdades de Ciências (1971), Licenciaturas em Ensino das Universidades Novas (1987), Profissionalização em Exercício (1980), Formação em Serviço (1985) e Profissionalização em Serviço (1988).

Joaquim Ferreira Gomes também se dedicou ao estudo da formação de professores secundários, particularmente no que diz respeito à formação psicopedagógica e aos modelos de ensino sucessivamente desenvolvidos. A sua obra principal intitula-se “A Escola Normal Superior da Universidade de Coimbra (1911-1930)”. Publicada em 1989, constitui a única monografia existente sobre estas instituições de formação. E, apesar de se dedicar explicitamente à escola de Coimbra, apresenta também bastantes referências à Escola Normal Superior de Lisboa.

Outro autor, João Evangelista Loureiro, analisou o percurso histórico dos modelos de formação de professores do ensino secundário em Portugal num conjunto de ensaios compilados na obra “À procura de uma pedagogia humanista (1990). Segundo Joaquim António de Sousa Pintassilgo e Maria João Mogarro merecem destaque os textos “Pressupostos da carreira docente: modelos de formação” e “História das instituições da formação de professores em Portugal”. Num dos volumes da “Obra completa” de Rui Grácio (1995), encontram-se, igualmente, bastantes reflexões sobre os professores do ensino liceal e a sua formação no período decisivo de transição do Estado Novo para a democracia, especificamente no contexto da Reforma de Veiga Simão.

Mais recentemente, mas ainda sobre este tema, assume relevância a obra de Raquel Pereira Henriques (2010) intitulada “Discursos legais e práticas educativas - Ser professor e ensinar história (1947-1974)”. Nela, a autora realiza um estudo sobre os professores de história ao longo de um período de cerca de três décadas que vai da reforma de 1947 até aos anos subsequentes ao 25 de abril de 1974. Raquel Pereira Henriques utiliza documentação existente no arquivo e biblioteca do antigo Liceu Normal de Pedro Nunes, atual Escola Secundária de Pedro Nunes, bem como nos arquivos históricos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e da Universidade de Coimbra, recorrendo nomeadamente aos livros de sumários.

Pintassilgo e Mogarro explicam a vantagem do recurso a este tipo de fonte documental: “A análise dos sumários das disciplinas teóricas lecionadas em contexto universitário permitiu-lhe, com as limitações que esse tipo de fonte contém, aproximar-se dos conteúdos ensinados por professores como Delfim Santos e Émile Planchard, entre outros, e dos problemas organizacionais que atingem essas aulas.”

Recentemente, a autora investigou a organização e o funcionamento do estágio através dos relatórios e trabalhos de estágio. Recorde-se que até ao final dos anos sessenta os candidatos a professores acediam ao estágio através de um exame seletivo de admissão. Os estágios não eram remunerados e tinham a duração de dois anos, sendo que no final implicavam a aprovação num exame de estado. “Os relatórios e trabalhos de estágio dão conta das práticas educativas consideradas legítimas, mas também de alguns esforços de inovação, de alguma maneira permitidos (e, por vezes, incentivados) num ambiente experimentar como era a do Liceu Normal”, referem Pintassilgo e Mogarro.

Nas considerações finais, Pintassilgo e Mogarro argumentam que o debate sobre a profissão tem permitido olhar para os professores a partir de novos ângulos. “Para muitos dos autores referenciados, os olhares para o passado da profissão e da formação foram mantendo um permanente diálogo com as inquietações e esperanças do presente e do futuro, como se pensar a profissão implicasse um olhar conjugado para temporalidades diversas que se interpenetram.”

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