Análise

"As escolas existem também para os adultos"

por Andreia Lobo


28 de janeiro de 2019 |

Como se combate a falta de alunos? Apostando na educação dos adultos. Como se torna a escola mais equitativa? Investindo de maneira diferente. O EDULOG ouviu os argumentos de Cláudia Sarrico, analista da OCDE.

Em Portugal não haveria falta de alunos se a escola tivesse em conta o potencial que existe na população adulta. Cláudia Sarrico, analista de políticas educativas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), acredita que o sistema educativo português tem “subvalorizado” a educação e formação dos adultos. A investigadora, que integra a equipa de Revisão de Recursos Escolares, é uma das especialistas que dia 30 de janeiro vai estar presente na EDUTALK “Como pensar a escola com menos jovens?”, organizada pela Fundação Belmiro de Azevedo para discutir o impacto da redução demográfica nas escolas.

“As escolas existem também para os adultos.” No caso português, assegura Cláudia Sarrico, esta constatação é ainda mais premente que nos países da União Europeia e até mesmo da OCDE. “Quando vemos que 55% da população adulta não tem o ensino secundário completo, percebemos que não há assim tanta falta de alunos.” Apesar de ser grande o benefício de voltar à escola, “não há essa procura”, esclarece a investigadora. Sabe-se que “as pessoas com baixas qualificações não procuram ter mais formação e que, pelo contrário, são os mais qualificados que apresentam mais probabilidade de voltar a estudar.” A solução passa por “ter uma estratégia para conseguir convencer estas pessoas da utilidade e do benefício de voltar à escola”, defende Cláudia Sarrico.

Resolver o problema da procura não é possível sem repensar o lado da oferta. São necessárias adaptações no sistema aos “novos alunos”, quer na rede de escolas, no tipo de cursos, nos horários e até na formação de professores, “que devem estar preparados para motivar as pessoas a fazer esse esforço”. De fora, surgem alguns exemplos: “Há países que financiam as pessoas para que elas ganhem qualificações.” Mesmo quando a motivação existe, mas faltam condições familiares, poderão surgir soluções para apoiar os adultos no regresso aos estudos. “Imagine-se, por exemplo, uma escola direcionada para adultos ter um serviço de babysitting enquanto as pessoas lá estão.”

Discriminar positivamente

O primeiro impacto da diminuição do número de crianças e jovens em “idade escolar” levou ao encerramento de vários estabelecimentos de ensino, sobretudo em meios rurais. “Portugal é sempre apresentado na literatura da OCDE como um exemplo de um país que fez um esforço de consolidação da rede escolar, adaptando-a às mudanças demográficas: muitas escolas fecharam, fizeram-se os agrupamentos de escolas, abriram novos centros escolares”, constata Sarrico.

No entanto, um dos últimos pareceres da OCDE sobre a gestão dos recursos educativos em Portugal apontava outros problemas, nomeadamente a falta de equidade no sistema educativo. “O que vemos [na OCDE] é que o financiamento dedicado a medidas que vão ao encontro dos alunos mais desfavorecidos é muito pequeno e vemos que, de facto, a escola portuguesa não é equitativa.”

Apesar de a escola portuguesa ser considerada uma “história de sucesso”, graças ao aumento nas taxas de qualificação e à melhoria nos resultados no PISA, constata a investigadora, “há uma grande variabilidade entre escolas (rurais e urbanas) e entre alunos da mesma escola, dependendo do seu estatuto socioeconómico.” Por isso, “o passo seguinte é tentar resolver esse problema”, resume.

O “Reviews of School Resources Portugal 2018” aconselha o país a alterar a fórmula de investimento na educação. E recomenda que o financiamento seja muito mais pensado em termos de equidade do sistema. Por exemplo, abandonando a ideia de reduzir o número de alunos por turma.

“Se reduzirmos o número de alunos por turma para todas as turmas isso não vai afetar da mesma maneira todas as escolas, além de que é uma medida cara”, começa por explicar Cláudia Sarrico, em resposta ao EDULOG. “Se pegássemos nesse dinheiro e, em vez de reduzir alunos em todas as turmas, deixássemos autonomia às escolas para reduzir onde precisam e, ao mesmo tempo, financiássemos de maneira diferente, discriminando positivamente alunos desfavorecidos, o sistema seria mais equitativo.”

partilhar

artigos relacionados