Análise
por Andreia Lobo
24 de março de 2023 |
Quando responderam aos testes do PISA 2018, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), os alunos portugueses mostraram as diferenças económicas, sociais e culturais que os separam. Os mais desfavorecidos têm mais dificuldades de aprendizagem, um pior desempenho na leitura e a probabilidade de repetirem um ano é cinco vezes superior à dos oriundos de contextos mais favorecidos. Além disso, é ainda provável que os alunos desfavorecidos frequentem escolas em que a população estudantil vem de meios socioeconómicos semelhantes.
Desde 2020, um novo indicador, criado pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e da Ciência (DGEEC), avalia a capacidade da escola ou do agrupamento para promover o sucesso dos alunos desfavorecidos. Este indicador entende o sucesso escolar como a conclusão de cada ciclo de ensino no tempo esperado e com classificações positivas nos exames nacionais, realizados no 9.º ano, a Português e a Matemática, e no 11.º e 12.º anos. Em 2020/2021, os alunos beneficiários de medidas adicionais de apoio à aprendizagem e inclusão atingiram desempenhos próximos da população estudantil, em geral. No ensino secundário, a taxa de sucesso (transição/conclusão) foi ainda mais elevada: 91,2% face a 90,2%.
A origem migrante e a etnia cigana são outros dos fatores que influenciam o desempenho dos alunos, em Portugal. Na leitura, e de acordo com os testes Pisa 2018, os migrantes pontuam menos 32 valores que os não migrantes. Entre 2011/2012 e 2018/2019, os alunos estrangeiros repetiram com mais frequência, no ensino básico e secundário, que os seus pares. A Eurydice estima que, em 2017, 13,9% de alunos migrantes estavam em situação de abandono precoce, face a 12,5% dos alunos nativos. Segundo o relatório Perfil Escolar das Comunidades Ciganas 2018/2019, da DGEEC, a taxa de desistência ou abandono escolar dos alunos ciganos era de 15,6%, no ensino básico, e de 12,6%, no ensino secundário, em comparação com 3,7% e 12,9%, respetivamente, para toda a população estudantil.
“A desigualdade educativa em Portugal é menos pronunciada do que noutros países da União Europeia (UE)”, revela o Monitor da Educação e da Formação 2022, mas as assimetrias regionais e a elevada percentagem de reprovações continuam a ser problemas.
O país, lê-se ainda no relatório, “carece de uma estratégia coerente para acompanhar e avaliar a equidade e a inclusão na educação”. Uma outra análise, do Strength through diversity: Education for inclusive society, publicado em 2020, sugere “o reforço da avaliação das práticas educativas inclusivas aos níveis local e escolar” e “a promoção de mecanismos de responsabilização”. Os professores, lê-se, precisam de mais oportunidades de aprendizagem profissional contínua, para apoiarem a diversidade e a inclusão.
Melhorar a rede de apoio à infância
Em 2020, 92,9% das crianças dos três até aos seis anos – a idade da escolaridade obrigatória – frequentavam o pré-escolar, em linha com a média, de 93,0%, mas abaixo da meta europeia estabelecida, de 96%. Aos três anos a frequência é inferior à média da UE (83,2%, face a 87,8%), mas superior aos quatro e aos cinco anos. A taxa de frequência é também muito superior à média da UE para as crianças com menos de três anos (53% face a 32,2%, em 2020). Neste cenário, a Comissão Europeia recorda a intenção do Governo em expandir a rede pré-escolar e proporcionar o acesso gratuito a cuidados de infância a todas as crianças com três anos.
Estatísticas da PORDATA revelam uma quebra no número de inscritos e na oferta de instituições: em 2021, 251 mil crianças, dos três aos seis anos, frequentavam a educação e acolhimento na primeira infância, ou seja, menos 25 mil do que em 2011. Consequentemente, o número de instituições foi reduzido de 6812, em 2011, para 5774, em 2021. Ainda em 2021, 46% das crianças estavam matriculadas em creches e jardins de infância privados, dessas, 96% com menos de três anos. Contabilizavam-se 17 064 educadores, menos cerca de mil crianças do que em 2021. A classe dos educadores também está a envelhecer: por cada sete educadores com mais de 50 anos, um tem menos de 35 anos.
Bons indicadores no abandono precoce
Em Portugal, há cada vez menos alunos a abandonar o ensino secundário sem o 12.º ano. Em 2021, a taxa de abandono precoce da educação e da formação atingia um mínimo histórico de 5,9%. Persistem, ainda assim, assimetrias regionais que variam entre mais de 20%, nos Açores e no Algarve, e abaixo da média nacional, na região Norte.
A Comissão Europeia atribui o êxito na redução das taxas de abandono precoce – que atingia os 23% em 2011, 14% em 2016 e 8,9% em 2020 – a políticas educativas como o programa TEIP (Territórios Educativos de Intervenção Prioritária) e o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar. Por outro lado, lê-se no Monitor da e Educação e da Formação 2022, Portugal é o país da UE em que a influência da escolaridade dos pais, no abandono precoce, é mais baixa. “O que demonstra que o sistema educativo é mais eficaz no apoio à mobilidade intergeracional do que noutros países.”
Rejuvenescer professores e renovar edifícios
O envelhecimento da classe docente e a falta de professores “estão a tornar-se desafios educativos importantes”, assinala a Comissão Europeia. Nos últimos 15 anos, em Portugal, o número de docentes diminuiu de 185 mil para 147 mil. Até 2028, 20% dos professores atuais irão reformar-se e 58% fá-lo-ão no prazo de dez anos, segundo o Estudo de diagnóstico de necessidades docentes de 2021 a 2030, encomendado pela DGEEC. Em disciplinas como o Português, Geografia, História, Biologia e TIC (Tecnologias da Informação e da Comunicação) já se verifica a falta de professores qualificados. A escassez de professores é especialmente acentuada na área metropolitana de Lisboa, em Setúbal e no Algarve, segundo as organizações sindicais.
A DGEEC estima que, até 2030/2031, o país vai precisar de cerca de 34 500 novos professores, mas há cada vez menos jovens a iniciar cursos de formação de professores e, por conseguinte, menos diplomados. O Ministério da Educação está a tentar inverter esta situação propondo a alteração do regime jurídico da habilitação profissional para a docência. O objetivo é criar margem para recrutar profissionais, de áreas que não o ensino, com experiência académica relevante para lecionar determinada disciplina. Os sindicatos de professores consideram, no entanto, que a medida põe em risco a qualidade do ensino.
As mudanças curriculares e a autonomia das escolas pedem novas formas de organização do espaço escolar e, segundo a Comissão Europeia, requerem a renovação ou modernização dos edifícios. A maioria das escolas portuguesas foi construída nas décadas de 1970 e 1980, e cerca de 50% destes edifícios ainda não foram renovados, referem os autores do relatório europeu.
Inscrições atingem recorde no ensino superior
Entre a população portuguesa, 47,6% dos indivíduos na faixa etária dos 25 aos 34 anos tinham um curso superior, segundo dados de 2021. O número de alunos que concorreram a instituições de ensino superior em 2021 atingia o segundo mais alto recorde, desde 1989. “A procura aumentou porque se candidataram mais alunos com notas baixas”, aponta a Comissão Europeia. Outro fator contribuiu para este recorde, lê-se: a possibilidade concedida às instituições, desde 2020, de poderem organizar concursos especiais de acesso para alunos do ensino profissional e artístico.
Há mais estudantes a concluir os cursos. A taxa de conclusão do ensino superior, entre as idades dos 25-34 anos, em 2021, foi superior (47,5%) à de 2020 em 5,6 pontos percentuais e ultrapassou a média europeia (41,2%). A nível regional, variou entre os 53,8%, na área metropolitana de Lisboa, e os 24,2%, nos Açores. Existe ainda uma divisão urbana/rural de 17,8 pontos percentuais, inferior à média europeia de 21,8%. A taxa de conclusão do ensino superior também variou consoante o país de origem dos alunos: em 2021, a taxa era mais alta para estudantes nascidos noutro país da UE (56,3%), seguidos dos nascidos em Portugal (47,6%) e dos nascidos noutro país estrangeiro (41,1%).
A disparidade de género na taxa de conclusão do ensino superior, a favor das mulheres, é superior à média da UE: 14,4% face a 10,8%. Em 2020, a percentagem de diplomados nas áreas CTEM (Ciência Tecnologia Engenharia e Matemática), no total de diplomados, foi de 27,8%, quase idêntica à de 2015. A percentagem de diplomados em TIC (2,65%) duplicou, desde 2015 (1,2%), a de diplomados em ciências naturais, matemática e estatística (6,2%) manteve-se ao nível de 2015.
Da análise ao ensino superior português ressalta uma última nota da Comissão Europeia, a de que “existe uma clara necessidade de formação pedagógica dos professores do ensino superior, a fim de [o] tornar mais atrativo para os alunos e evitar o abandono”.