Estudos

Creche: atender com qualidade a crianças do zero aos três anos

por EDULOG


21 de novembro de 2016 |

Ter em conta todas as áreas de desenvolvimento da criança, estabelecer relações seguras e usar uma vasta gama de estratégias para enriquecer as aprendizagens. São alguns princípios que garantem um atendimento de qualidade nas creches às crianças em idades precoces.

A “National Association for Education of Young Children” perspetiva um conjunto de práticas adequadas ao desenvolvimento de crianças até aos três anos de idade. Incluir estas orientações na formação inicial de educadores de infância, para serem usadas em contexto de creche, pode aumentar a qualidade do ambiente educativo. Os argumentos são de Ana Pinto e Maria Dias, investigadoras na área das ciências da educação da Universidade de Coimbra e Maria Cró, do Instituto Politécnico de Coimbra.

“Durante muito tempo, a formação dos educadores de infância incidiu, especificamente, no desenvolvimento/ativação de competências de crianças a partir dos três anos de idade, muito por força da Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) e da perspetiva assistencialista”, escrevem as autoras no artigo “A Formação de Educadores de Infância: Práticas Adequadas ao Contexto Educativo em Creche”, publicado na Revista Portuguesa de Pedagogia, em 2013.

Apesar de a LBSE não contemplar a educação de crianças do zero aos três e os planos de estudos do 1.º ciclo do curso de Educação Básica do ensino público não se referirem especificamente ao contexto de creche, nem a conteúdos relativos a esta faixa etária, Pinto, Dias e Cró reconhecem que “tem havido, por parte da entidade que tutela a resposta social creche (Instituto da Segurança Social) uma aposta na qualidade do serviço a prestar a crianças até aos três anos”. Exemplos: a introdução do Modelo de Avaliação da Qualidade, o Manual de Processos-Chave e os Questionários de Avaliação da Satisfação.

Tendo em conta a sua experiência na docência, Pinto, Dias e Cró acusam a existência de um “desajuste” da formação inicial de educadores de infância em relação à realidade profissional. As autoras criticam a “tradição verbalista” dos cursos e a falta de prática pedagógica que propõem seja “transversal a todos os contextos educativos, para os quais o curso de formação inicial habilita o educador, e adquira, portanto, caráter obrigatório”. Pinto, Dias e Cró sugerem que o processo formativo inclua “uma formação cientifica acerca do contexto educativo de creche e da criança em idade precoce mais consistente”, essenciais para o desenvolvimento das competências dos futuros educadores.

Competências dos educadores

Uma das principais competências que a formação inicial deve desenvolver no educador diz respeito à capacidade de se centrar na criança, tal como defende a investigadora Gabriela Portugal. Trata-se da capacidade “para reconhecer a diversidade; para aceder à perspetiva da criança; para integrar num espaço coletivo, habitado por crianças e adultos, a diversidade de interesses e necessidades; [para a] procura de harmonia entre teoria e prática e/ou capacidade para (re)construir sistematicamente o conhecimento sobre as crianças e sobre como aprendem”, explicam Pinto, Dias e Cró. Outros autores consideram também importante que entre as competências do educador esteja a capacidade de estabelecer relações afetivas seguras com as crianças, “envolvendo-as num clima de confiança e liberdade onde seja possível à criança tomar a iniciativa de escolher temas e atividades, apoiadas pelos adultos”.

Pinto, Dias e Cró sublinham que “o educador deve ser competente, também para intervir de forma estimulante e expandir as oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento da criança e para organizar situações em que seja possível trabalhar e brincar em pequenos grupos”.

Práticas adequadas ao contexto de creche

Vários estudos na área da psicologia e, mais recentemente, na das neurociências mostram que a frequência de contextos educativos de elevada qualidade tem uma importância significativa para o desenvolvimento das crianças. Com o objetivo de formar profissionais de alto nível, segundo as recomendações de Teresa Vasconcelos, do Conselho Nacional de Educação (CNE), as autoras propõem dez princípios que “devem nortear a intervenção educativa realizada em contexto de creche”.

  1. Envolver as crianças em coisas que lhes dizem respeito – não trabalhar por elas ou distraí-las para conseguir que o trabalho seja feito mais rápido;
  2. Investir em tempos de qualidade - prestar atenção e observar cada criança individualmente, sem perder a noção do grupo, em vez de estabelecer a supervisão de grupos;
  3. Compreender as formas de comunicação de cada criança (choros, palavras, movimentos, gestos, expressões faciais e posições corporais) – não subestimar a sua capacidade de comunicação;
  4. Concentrar se na criança como um todo, não se focando apenas num determinado nivel de desenvolvimento, seja cognitivo, psicomotor, afetivo, linguistico etc. ou entende lo como separado do restante desenvolvimento;
  5. Respeitar as crianças enquanto pessoas de valor e ajuda las a reconhecer e a lidar com os seus sentimentos;
  6. Ser verdadeiro nos sentimentos relativamente às crianças — não fingir sentimentos, pois as criancas tem uma sensibilidade tal, que se apercebem quando o educador é ou não autentico;
  7. Modelar os comportamentos que se pretendem ensinar — não repreender, mas deixar claro para a crianca o que se deve ou nao se deve fazer;
  8. Reconhecer os problemas como oportunidades de aprendizagem e deixar as crianças resolver as próprias dificuldades — não tentar protege las de todos os problemas, nem resolve los constantemente tornando lhes a vida fácil, promovendo, assim, a sua autonomia;
  9. Ajudar a construir segurança, promovendo atividades que desenvolvam a confiança em si — a desconfiança leva frequentemente a uma inconstância nos comportamentos e a dependência;
  10. Procurar promover a qualidade do desenvolvimento em cada fase etária, sem apressar a criança, para atingir níveis de desenvolvimento superiores, pois cada criança tem o seu próprio ritmo.

Subscrevendo as recomendações do CNE, Pinto, Dias e Cró salientam a importância da formação inicial dos educadores de infância para a “otimização” da qualidade dos serviços prestados às crianças até aos três anos, “a qual é fulcral, pois é precisamente na primeira infância que se edificam as bases para o desenvolvimento global da criança”.

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